Poesia "Peço Silêncio" [Pablo Neruda]

2024-07-16 7

Prêmio Nobel de literatura em 1971, Pablo Neruda foi nomeado cônsul para a emigração espanhola, residente em Paris, e, pouco depois, cônsul geral no México, onde reescreveu o seu Canto General de Chile, transformando-o num poema épico sobre todo o continente sul-americano, a sua natureza, o seu povo e seu destino histórico.
Entre suas obras dos últimos anos podem ser citadas Cien sonetos de amor (1959), que inclui poemas dedicados à sua esposa Matilde Urrutia, Memorial de Isla Negra, obra poética de caráter autobiográfico em cinco volumes, publicada por ocasião de seu sexagésimo aniversário, Arte de pajáros (1966), La Barcarola (1967), a peça Fulgor y muerte de Joaquín Murieta (1967), Las manos del día (1968), Fin del mundo (1969), Las piedras del cielo (1970 ) e La espada encendida.
Poesia "Peço Silêncio"[Pablo Neruda]

Agora me deixem tranquilo.
Agora se acostumem sem mim.

Eu vou cerrar os meus olhos.

Somente quero cinco coisas,
cinco raízes preferidas.

Uma é o amor sem fim.

A segunda é ver o outono.
Não posso ser sem que as folhas
voem e voltem à terra.

A terceira é o grave inverno,
a chuva que amei, a carícia
do fogo no frio silvestre.

Em quarto lugar o verão
redondo como uma melancia.

A quinta coisa são os teus olhos,
Matilde minha, bem-amada,
não quero dormir sem os teus olhos,
não quero ser sem que me olhes:
eu mudo a primavera
para que me sigas olhando.
Amigos, isso é quanto quero.
É quase nada e quase tudo.

Agora se querem, podem ir.

Vivi tanto que um dia
terão de por força me esquecer,
apagando-me do quadro-negro:
meu coração foi interminável.

Porém porque peço silêncio
não creiam que vou morrer:
passa comigo o contrário:
sucede que vou viver.
Sucede que sou e que sigo.

Não será, pois lá bem dentro
de mim crescerão cereais,
primeiro os grãos que rompem
a terra para ver a luz,
porém a mãe terra é escura:
e dentro de mim sou escuro:
sou como um poço em cujas águas
a noite deixa suas estrelas
e segue sozinha pelo campo.

Sucede que tanto vivi
que quero viver outro tanto.

Nunca me senti tão sonoro,
nunca tive tantos beijos.

Agora, como sempre, é cedo.
Voa a luz com suas abelhas.

Me deixem só com o dia.
Peço licença para nascer.

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