O ano de 1961 foi o pior do salazarismo. Em Janeiro, depois da constipação, a gripe atacou fortemente o presidente de Conselho. A debilidade de saúde de Oliveira Salazar podia ser interpretada como mau presságio. E com razão de ser. O ano decorreu difícil na metrópole - com o lento início do fim do Estado Novo - e nas colónias, com o eclodir da guerra, onde morreram 8803 militares portugueses e 15 507 ficaram portadores de deficiência permanente. A guerra começou a desenhar-se em Angola. Ao massacre da Baixa do Cassange, sucede a 4 de Fevereiro o assalto às prisões e à esquadra da PSP na capital angolana. A 15 de Março, deflagraram sangrentos ataques no Norte.
PRIMEIRO MASSACRE
O dia ficou na história como feriado nacional em Angola: 4 de Janeiro de 1961. Milhares de agricultores da antiga Companhia Geral de Algodão de Angola (Cotonang) teriam sido mortos - reclamam os angolanos - pelos militares portugueses, na Baixa do Cassange, distrito de Malange, como resposta a manifestações exigindo melhores condições de trabalho e a abolição do trabalho forçado. O então segundo-sargento miliciano José Moura (hoje com 76 anos), da 3ª Companhia de Caçadores Especiais, a única tropa portuguesa no terreno àquela data, conta: "Não houve mortos nenhuns feitos pela nossa Companhia até ao dia 2 de Fevereiro. Nesse dia, estávamos na Baixa do Cassange, mas não matámos ninguém. Quem lá estava também era a PIDE, a fazer interrogatórios, e se mataram alguém... é possível."
Já a 11 de Janeiro de 1961, estala a revolta - instigada por emissários da União dos Povos de Angola (UPA), vindos do ex-Congo Belga. A onda de rebelião varre toda a Baixa do Cassange, causando a morte de um capataz da Cotonang. No dia seguinte, um pelotão da 3ª Companhia de Caçadores Especiais, comandado pelo tenente Silva Santos, é rodeado por um grupo numeroso de revoltosos. O chefe deste grupo só se dispõe a falar ao tenente se as suas forças depusessem as armas. O que veio a acontecer. Silva Santos levou os líderes daquele grupo ao chefe de posto administrativo de Milando. E assim se acalmaram os ânimos.
Os dias seguintes foram de tensão, mas não ficaram marcados por confrontos. Em Malange, no dia 1 de Fevereiro à noite, os militares da 3ª Companhia são chamados ao quartel, quando alguns, entre eles José Moura, estavam no cinema a ver o filme ‘Orfeu Negro'. Um comerciante de Cunda Ria-Baza tinha estado reunido com o comandante da Companhia, contando-lhe da aproximação de uma invasão daquela localidade pela UPA.
Era já uma da madrugada do dia 2 de Fevereiro quando, debaixo de fortes chuvadas, partiu para Cunda Ria-Baza um ‘pelotão menos' - com cerca de 20 homens - da 3ª Companhia de Caçadores Especiais. Ao amanhecer, os militares ouvem a ira popular: "Vai-te embora, branco."